Imagem do mês de fevereiro. Entrevista com o autor.

23/02/2016

por Verónica Savignano

Nanobastões de ouro crescidos sobre nanotubo de carbono.

Nanobastões de ouro crescidos sobre nanotubo de carbono.

Carbono e ouro compõem a nanoestrutura que ilustra a página do mês de fevereiro do calendário do Instituto Nacional de Engenharia de Superfícies. Carbono, no nanotubo (de poucos nanômetros de diâmetro), formado por uma série de folhas de grafeno enroladas, de um átomo de espessura cada uma. Ouro, nos nanobastões que parecem enfeitar o nanotubo.

O autor principal da imagem é Anderson Caires de Jesus, doutorando na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), e microscopista do Centro de Microscopia dessa universidade, onde foi realizada a imagem usando um microscópio eletrônico de transmissão,

Em seu mestrado, Anderson, orientado pelo professor Luiz Orlando Ladeira, desenvolveu um método de síntese de nanoestruturas híbridas como a da imagem. Além disso, explorou uma de suas possíveis aplicações: usá-las como amplificadores de sinal na identificação de moléculas por meio da técnica de espectroscopia Raman. Partindo dessa possibilidade, Anderson e colaboradores deram mais um passo e desenvolveram nanossensores que detectam compostos químicos e estruturas biológicas, podendo ser usados para diagnóstico médico ou veterinário e para análises químicas. O trabalho já gerou 4 pedidos de patente, além de artigos publicados em periódicos indexados internacionais, e um projeto de empresa spin-off, em busca de investimentos.

Em entrevista a nosso boletim, Anderson Caires explica brevemente como fabricou as nanoestruturas de carbono e ouro e conta mais sobre as aplicações desenvolvidas.

Boletim Engenharia de Superfícies: – Como foi fabricado o “tubinho enfeitado” da imagem do calendário? Por que nanobastões e nanotubo grudam?

Anderson Caires: – Esta imagem mostra nanobastões de ouro crescidos sobre a superfície de nanotubos de carbono. Neste projeto, desenvolvemos um novo processo de síntese de nanoestruturas hibridas, entre nanomateriais de carbono e nanoestruturas de ouro. O processo começa com a redução química de uma solução aquosa de um sal de ouro na presença de materiais de carbono, isso provoca o crescimento de pequenas nanopartículas de ouro em regiões ativamente funcionalizadas dos nanotubos de carbono de paredes múltiplas. Essa solução é então submetida a um processo fotoquímico com irradiação de luz ultravioleta. A ação da luz provoca diversas reações químicas que atuam para promover o crescimento in situ de nanobastões de ouro, utilizando as nanopartículas crescidas pela redução química como base. Podemos controlar a morfologia através da adição de surfactantes. Como o crescimento acontece in situ, os nanobastões ficam fortemente aderidos na superfície dos nanotubos de carbono.

A imagem foi realizada usando um microscópio eletrônico de transmissão (MET) Tecnai de 200 KV, instalado no Centro de Microscopia da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG.

Boletim Engenharia de Superfícies: – Conte-nos um pouco sobre o contexto em que foi realizada a imagem: o projeto no qual se insere, os resultados obtidos nesse projeto etc.

Anderson Caires: – Esta imagem é referente ao meu trabalho de mestrado intitulado “Desenvolvimento de nanomateriais e nanocompósitos para aplicação em detecção química e biológica por espalhamento de luz”. Neste trabalho, eu estou desenvolvendo nanocompósitos entre nanomateriais de carbono (nanotubos de carbono e óxido de grafeno) e nanopartículas de ouro anisotrópicas. Estamos aplicando estes materiais para detecção química e biológica através de espalhamento de luz, utilizando principalmente a técnica de espectroscopia Raman. Na espectroscopia Raman, uma impressão digital molecular pode ser identificada pelo espectro vibracional da molécula em estudo. Porém, o sinal Raman de diversas moléculas é muito fraco, sendo de difícil detecção em medidas convencionais. Assim, um efeito especial, chamado efeito SERS (surface-enhanced Raman spectroscopy), está sendo muito estudado nos últimos anos. Resumidamente, este efeito é uma amplificação do sinal Raman através da interação entre as moléculas em estudo e nanopartículas metálicas. Este material é ótimo para esse tipo de medida por que os nanotubos servem de template para os nanobastões, aumentando a interação entre eles, e ainda aumentando a superfície de absorção para as moléculas. Estamos desenvolvendo sistemas de detecção de compostos químicos para diversas aplicações baseadas neste processo. Durante este projeto publicamos dois artigos em revistas internacionais e temos um terceiro submetido; além disto, depositamos quatro pedidos de patente para o processo e produto. O artigo que trata em particular do trabalho que originou a imagem premiada, pode ser encontrado na referência abaixo. Nossa principal fonte de financiamento são as agências de fomento (CNPq, CAPES e FAPEMIG) através de bolsas e projetos de pesquisa.

Referência: A.J. Caires et al; Highly sensitive and simple SERS substrate based on photochemically generated carbon nanotubes/gold nanorods hybrids, Journal of Colloid and Interface Science, 455 (2015), 78–82. doi:10.1016/j.jcis.2015.04.071

Boletim Engenharia de Superfícies: – Comente quais são as aplicações dos nanobastões de ouro crescidos sobre nanotubos de carbono. São todas aplicações potenciais ou alguma já existe na sociedade fora do laboratório?

Anderson Caires: – Estamos aplicando este material como nanosensor para detecção de compostos químicos e estruturas biológicas, direcionados para o setor de análise química e diagnóstico médico/veterinário in vitro. Como o processo é simples e proporciona grande amplificação de sinal, foi possível desenvolver um sistema de detecção mais eficaz, sensível e barato que as tecnologias atualmente disponíveis no mercado. Isso é possível porque através da interação entre este material e as moléculas em estudo, podemos identificar uma assinatura molecular especifica de cada molécula, e em baixíssimas concentrações, da ordem de nanomolar ou até mesmo mais diluídas. Estamos buscando financiamento para criação de uma empresa focada nestes novos materiais e em sua produção comercial.

foto anderson

Anderson Caires

Boletim Engenharia de Superfícies: – Gostaria de agradecer alguém que tenha participado da realização da imagem vencedora?

Anderson Caires: – Gostaria de agradecer a toda a equipe do laboratório de nanomateriais do departamento de física da UFMG, e à equipe do Centro de Microscopia da UFMG.

Para entrar em contato com Anderson:

E-mail: andersoncaires@outlook.com. Linkedin: https://br.linkedin.com/in/andersoncaires


Imagem do mês de dezembro: minientrevista com o autor.

01/12/2014

imagem dezembroA partir da imagem de dezembro do calendário do Instituto de Engenharia de Superfícies, podemos imaginar diversos cenários. Por exemplo, uma cerca abandonada à ação do tempo. Contudo, objetivamente, o que a imagem de microscopia eletrônica de varredura (MEV) mostra é uma tela de aço inox recoberta por nanotubos de carbono. Detalhe: os nanotubos foram obtidos a partir dos gases gerados pela queima controlada do bagaço da cana-de-açúcar.

O autor da imagem, Joner Alves, 32 anos, é bacharel em Física e mestre em Engenharia de Materiais pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), e doutor em Engenharia Metalúrgica e de Materiais pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente é diretor do Instituto SENAI de Inovação em Tecnologias Minerais.

Segue uma breve entrevista com o autor.

1. Explique-nos de que maneira foram obtidos os nanotubos da imagem premiada.

O bagaço da cana foi incinerado em um forno com atmosfera controlada. O efluente da queima foi submetido a um filtro de carboneto de silício e em seguida direcionado a um segundo forno, no qual entrou em contato com um sistema catalisador composto por telas de aço inoxidável. O processo resultou em um material sólido, no qual foram obtidos os nanomateriais, materiais com ampla gama de aplicações devido as suas excelentes propriedades.

2. Conte-nos um pouquinho a respeito o contexto em que foi realizada a imagem.

A pesquisa é referente a minha tese de doutorado, defendida em 2011 no Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais da USP, sendo parte dela realizada na Northeastern University (Boston, EUA), onde foi feita a imagem premiada.

3. Comente o impacto social do trabalho.

O destino dos resíduos sólidos é uma problemática mundial, sendo que uma alternativa para a deposição dos resíduos poliméricos é a queima controlada visando a produção de energia. A minha pesquisa teve como objetivo estudar os gases gerados durante a queima destes materiais, visando o reaproveitamento na síntese de nanomateriais.

Materiais com alto valor agregado foram produzidos a partir de resíduos, com destaque para os nanotubos de carbono. Além disto, o sistema catalisador empregado reduziu as emissões gasosas provenientes da queima dos resíduos. Deste modo, a metodologia elaborada representa um incentivo para a cadeia de produção de energia através de resíduos através da criação de valor agregado com a produção dos nanotubos. Outro importante fator é a possibilidade de redução do custo da produção dos nanomateriais, uma vez que os resíduos empregados são matérias-primas de baixo custo.

4. Gostaria de agradecer alguém que tenha ajudado na realização da imagem vencedora?

O trabalho foi orientado pelo Prof. Jorge Alberto Soares Tenório da Escola Politécnica da USP e co-orientado pelo Prof. Yiannis Levendis da Northeastern University. O projeto contou com o apoio do CNPq e da CAPES.

5. O trabalho foi objeto de outros prêmios, não é mesmo?

A pesquisa também deu origem às premiações:

2013 – Prêmio AEA de Meio Ambiente – 1º Lugar na Categoria Acadêmica – Trabalho: “Geração de energia e produção de nanotubos de carbono a partir do resíduo da produção de etanol”, Associação Brasileira de Engenharia Automotiva – AEA.

2012 – Prêmio AEA de Meio Ambiente – Menção Honrosa: Categoria Acadêmica – Trabalho: “Synthesis of nanomaterials from unserviceable tires”, Associação Brasileira de Engenharia Automotiva – AEA.

2012 – Prêmio Antonio Mourão Guimarães – Melhor trabalho sobre fabricação e uso de materiais refratários, Associação Brasileira de Metalurgia, Materiais e Mineração (ABM) / Magnesita S.A..

2012 – Prêmio Capes de Tese: Menção Honrosa na Categoria Engenharias II, Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Capes.

2012 – Prêmio Vale-Capes de Ciência e Sustentabilidade: Melhor tese de doutorado na área, CAPES e VALE S.A..

2010 – Prêmio MERCOSUL de Ciência e Tecnologia – 1º lugar: Categoria Jovem Pesquisador, UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura.

Para contatar o Joner:  joner.isi@senaipa.org.br.